domingo, 27 de fevereiro de 2011

Sujos

Sofás. Banheiros. Travesseiros. Era na cama, na varanda, na sala de estar. Não havia frio que suportava o nosso calor. Faíscas. Ejaculando fogos de artifício pode onde a gente se deitava. Qualquer motivo era deixa pra se resolver na cama - ou fora dela, tanto faz. Juntávamos a sujeira do mundo e nela fazíamos nosso Alcorão. Era a visão, o som, o paladar, uma sinestesia que nos queimava por dentro. Os pecados capitais se juntavam e brindavam diante nosso espetáculo de explosão de todo o dia. Vendidos, perdidos, garotos que se guiavam apenas pela intuição. Se isso era bom ou ruim, não era o nosso departamento. Nossa religião era a dor, a provocação. As línguas que nos arremessavam ao Valhalla, os gemidos servindo como Código Morse, o léxico deprimente e afrodisíaco. Nem nós sabíamos quem era quem nessa dança. Dois bichos, duas feras, duas fúrias mitológicas que não mediam esforços pra derramar seu mel um no outro. Era perder a sanidade se ficávamos cativos, longe do calor que emprestávamos um ao outro. Eu me perco quando você pesa em mim. Isso, assim. Mais, isso. Mais forte. Mais lento. Senta, me pisa. Me toma. Pega na minha taça, me bebe. Me esquece assim que o Sol nascer. Me usa de novo quando a Lua surgir. Vamos gozar na vida antes que ela goze na nossa cara. ( Leandro Merlllin )



Às vezes o local importava sim: quanto mais inusitado, melhor. Profanar a casa da mãe ou a mesa do chefe já era fichinha, queríamos mais, queríamos espalhar pelo céu nossa polução diária e sujar as nuvens com o nosso suor continuo. E gemer pra acordar toda a cidade. Isso quando se podia gemer. Certas situações pedem adaptações, e por vezes só se podia sentir a explosão e ver na cara as cores da alegria. E que caras! Uma mistura de gozo, malícia e embaraço que você sempre dizia que eu fazia. Um quê de maldade, gentileza e ferocidade que você mostrava tão bem. Tudo era diferente e se encaixava de modo tão certo, que sabendo disso resolvíamos a todo instante provar que a química acontecia entre nós e que desafiar as leis da física era possível: dois corpos ocupavam sim o mesmo lugar ao mesmo tempo, e ocupavam de vibrante, molhada, rústica, carnal.E a cada dia se acrescentava algo, se tentava uma posição nova, um bicho era solto.E a única lei era se perder a cada gole, a cada aumento da temperatura.Afinal, o que mais se podia fazer? Era bom ser usado, insano, bandido. Era bom dar uma gozadinha.Era não, é, é sempre bom. Vamos gozar na vida antes que ela goze na nossa cara. ( Maisa Huayna )




Para mais sujeira e criatividade, leia :http://des-contados.blogspot.com

terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Do amor só se pode fazer necrópsia, jamais biópsia.*

Estou amando, mesmo, de modo que vivo meus dias para ver o amor no mundo. Dia desses, por exemplo, vi um homem pregar o evangelho enquanto o sinal estava vermelho. Amei-o de tal forma, amei toda a sua coragem e convicção, que por todo o tempo em que ele bradava aos quatro ventos as palavras do profeta, eu queria abraçar e cuidar dele somente, mesmo que tudo o que ele dizia não fizesse sentido para a minha mente budista.
Não sei se amar de forma tão intensa é bom ou ruim, acredito que saberei mesmo os resultados de tal ato somente daqui a um tempo, quando puder analisar os fatos de forma imparcial. Como o próprio título do texto diz o amor só pode ser avaliado quando morto, ou melhor, segundo Freud, só poderei analisar quando ter o amor for possível, pois ai não mais o amarei, já que se ama somente aquilo que não se tem.



* : Roberto Freire, em Ame ou dê vexame.